Diz-me, Mundo, não estás cansado?
Tens que estar, não é possível que não estejas cansado! Cansado, sabes o que é?
Quando dói, mas uma dor de habituação, na vez daquela dor lancinante da
surpresa, aquela que vem quando nos pregam uma rasteira e caímos ao chão de
corpo todo. É sim aquela dor que mói, que pressiona os músculos, que os faz
moverem-se mais devagar, ainda que a cabeça diga para correr. É isso o cansaço…
Deves estar cansado…, não estás?
Pronto! Digo eu primeiro: estou
cansada!!! Cansada destas lutas diárias contigo, deste eterno braço de ferro,
que ganho nuns dias, perco noutros. Dias de glória, seguidos de dias de amarga
derrota. E de bater de frente contigo, das nódoas negras que mal se vêm, mas
estão lá… Na minha pele e na tua, Mundo! Não julgues que não tens marcas,
porque também as tens, debaixo dessa tua basófia de que és superior a tudo, de
que nada te atinge e nada te fere. És tão frágil como eu e como todos os
outros. Só te julgas mais forte.
Mas tens a teu favor a vantagem da
indiferença. Da indiferença de todos quantos se conformaram e vivem agarrados a
ti. Alimentando-se de ti. Controlados por ti. Numa espécie de simbiose
aparentemente equilibrada. E nem tu nem eles notam isso. Tu não notas que
ninguém te reverencia, que apenas a necessidade e a comodidade os mantêm
contigo. Muito menos eles notam que já se perderam a si mesmos…
E eu estou tão cansada… Por isso
hoje apetece-me dizer-te que ganhaste! Que desisto! Que me leves tudo! Tudo o
que sou, o que acredito, o que quero! Leva, leva tudo! Na realidade já tanto me
tiraste, já tantos pedaços faltam neste puzzle embaralhado! Porque não levares
tudo??
Leva, e deixa-me! Deixa-me aqui, sozinha,
mas livre! Não pedirei nada mais!
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Monólogos da Desalinhada #