Chegava sempre à mesma hora.
Colocava a banqueta e a tela no mesmo
sítio, sempre. Sentava-se, tirava os pincéis. Começava a misturar as tintas.
Rodava um pouco a tela – talvez para melhor a ajustar à luz.
Parava e esperava.
E, depois, quase sempre à mesma hora,
pintava durante mais ou menos 15 minutos.
No início eram pinceladas largas, depois
começaram a ser mais minuciosas.
Poisava os pincéis, arrumava-os, às
tintas, ficava um pouco ali, imagino que a deixar os traços do dia secarem.
Pegava então por fim na tela, na maleta
e na banqueta. Levanta-se, para voltar no dia seguinte, à mesma hora.
Mas houve um dia que não voltou. No dia
seguinte e no outro e no outro também não.
Parecia ter cumprido a sua missão, mas
qual ela era, eu nunca saberia.
Marta
tinha chegado a casa havia pouco tempo, chovia lá fora, não parecia temporal,
apenas aquela chuva que bate baixinho na janela e nos embala a preguiça.
Ouviu
bater à porta.
Lá
estava um homem – que achava já ter visto antes, mas não sabia onde.
Na
mão trazia uma tela que lhe entregou. “É para ti, quero que te vejas como eu te vejo.”
Na
tela viu o seu rosto, mas ao mesmo tempo um rosto que nunca tinha visto antes
ao espelho.
Olhou
para ele e sorriu.
E
então ele desapareceu.
***
He always arrived at the same time.
He would place the stool and the canvas in
the same place, always. He sat, pulled the brushes. Then would begin to mix the
paints. Turn the canvas a bit - perhaps to better adjust to the light.
He stopped and waited.
And then, almost at the same time, he
painted for about 15 minutes.
First there were broad brushstrokes,
then they began to be more thorough.
He would lay down the brushes, arrange
them, the paints, and would stay there for a bit, I imagine he was waiting for
the traces of the day to dry up.
Then finally he picked the canvas, the
suitcase and the stool. He got up, just to go back the next day, same time.
But then there was a day that he did not
return. The next day and the next and the next either.
He seemed to have accomplished his mission,
but what that was, I would never know.
Marta
had arrived home a little time ago, it rained outside, it didn’t seemed like a
storm, only the rain hitting the window softly, cradling her laziness.
She
heard knocking.
At
the door it was a man – who she thought she had seen before but did not know
where.
He
was holding a canvas that he gave her. "It's for you, I want you see
yourself as I see you."
On
the painting she saw her face, but at the same time a face that she had never
seen in a mirror before.
She
looked at him and smiled.
And then he disappeared.
ResponderEliminarO que mais me encanta nos teus escritos é que em contos e histórias pequenas como esta consegues dizer tanto ou mais do que numa história completa!
Talento, Muito Talento
Beijinhos
Bom Fim de Semana
Sarah
Às vezes é preciso mudar de telas e desaparecer...
ResponderEliminarUma pequena história muito bem contada.
Um beijo, querida amiga.
Minha querida
ResponderEliminarHoje passando para agradecer a presença carinhosa e as belas palavras...fiquei emocionada e feliz.
Um beijinho com carinho
Sonhadora
de como os outros nos veem
ResponderEliminare nós a imaginar que 15 minutos não são nada para os pincéis e as tintas e o amor
um abraço, Isa
tão bonito.
ResponderEliminardiria que se passou algo parecido comigo.
com uma leve diferença.
entregaram-me a tela sem nunca me terem visto pessoalmente, mas, apenas uma foto.
ainda hoje guardo a tela emoldurada.
bom domingo
beijo
É uma história linda, cheia de mistério, de fantasia e de amor.
ResponderEliminarQue lindo pai natal pintor!
Bom Natal para si, querida amiga e obrigado pela sua visita com a tela bonita das suas palavras.
Muito bonito!
ResponderEliminarÀs vezes é preciso alguém nos pintar numa tela, para conseguirmos ver para além do que os espelhos mostram.
Beijinhos
Não tarda a Primavera está aí e... não são só as andorinhas que voltam.
ResponderEliminar:)
Gostei da escrita (e da música) muito.
Boas escritas e Boas Festas!
Talvez fosse um anjo, disfarçado de gente,
ResponderEliminarpara lhe mostrar quanta beleza havia no rosto que ela não via.
no rosto e na alma.
Gostei muito, como sempre!
quero agradecer-te, a palavras que deixas no minha "poesia"
:)
e desejar-te um Feliz Natal e Ano Novo cheio de tudo a que tens direito! Beijinhos!