Quem lê / Who's reading

"a escrita é a minha primeira morada de silêncio" |Al Berto

domingo, 28 de outubro de 2012

Noite de bruxas / Halloween night (II)

(Nightwish,The Phamtom of the Opera)


Há um ano que a serra me chama. Embrenho-me cada vez mais nas suas profundezas e nem sinal do meu misterioso amigo. A não ser a estranha convicção de que alguém me observa, a uma distância que não sei quanto segura é.

Quase me aventurei na noite, disposta até a encontrar vestígios dos velhos rituais que não sei se já consigo compreender.

Mas só numa noite do ano podemos estar entre os humanos, disse-me ele. Não fora isso, e o apelo da noite seria – suspeito - irresistível. Só assim já me acorda a meio da noite, arrancando-me de um sonho que acaba sempre da mesma forma.

Volto àquele sítio, sou eu mesma, vejo o meu rosto reflectido nos espelhos, não foi sonho, não naquela noite, apenas nas que se seguiram.

Aproxima-se outra noite das bruxas, ainda sei o caminho, voltarei lá. Vou cumprir a minha promessa, não apenas para manter a minha palavra, mas porque os sonhos não me são suficientes.


-/-/-/


The mountain is calling for  me for over a year. I go in deeper and deeper, and no sign of my mysterious friend. Unless for the strange belief someone is watching me, from a distance I’m no sure how safe it is.

I almost ventured in the night, willing to find traces of old rituals, I’m still not sure I can understand by now.

But we can be among the humans only one night of the year, he said. If not for that, the calling of the night would be - I suspect - irresistible. Just so, it awakes me in the middle of the nigh, ripping me off a dream that always ends up the same way.

I came back to that same place, I see my face reflected in the mirrors. It was not a dream, not that night, only in the ones that followed.

Another Halloween is coming, I still know the way, I will be back there. I will keep my promise, not to just for  my word, but because dreams are not enough.

(Part III)

quinta-feira, 25 de outubro de 2012

Quimeras (ou histórias de um faroleiro) / Chimeras (Or stories of a lighthouse keeper) - III

(Parte II)


Ao chegar a esta parte da historia, fez uma pausa e fitou-o: “Conheces esse faroleiro? Era aquele o farol?”
“Julgo que sim.”, disse ele, “Foi ele que me contou que as sereias existem. Mas diz-me, a tua avó, chegou a descobrir o que havia para lá do horizonte?”
“Sim, um dia partiu num barco, da cidade. Percorreu o país, muitos países, só parou quando as pernas já não respondiam ao seu apelo.”
“Antes de ir na sua viagem última, pediu-me que viesse aqui, aonde viu o início do horizonte. Pediu-me que deitasse ao mar este pendente.”
Nas mãos segurava um fio de couro, com uma concha perfeita.
“Acho que era a sua forma de voltar a casa.”
“Sim”, disse ele, “acho que devias atirá-lo do alto do farol; se quiseres, levo-te lá.”
Ela sorriu e levantou-se.
“Vamos!”
Entendeu então porque é que o faroleiro dizia que o apelo do mar tinha levado a sua sereia. Mas, para ele, o do farol tinha ganho. O amor não fora suficiente para soltar as amarras de um e para prender outro.
Mas ele procurava uma sereia há anos. Agora que a encontrara, se o mar a chamar… aprenderá a nadar!

...Fim? ...

Sagres, by Isa Lisboa

(Part II)


On this part of the story, she stopped and looked at him: “Do you know that lighthouse keeper?” Was that the lighthouse?”
“I believe so”, he said, “He’s the one who told me mermaids exist. But tell me, your grandmother, did she ever find out what was there beyond the horizon?”
“Yes, one day she left on a boat, from the city. She went across the country, many coutries, only stopped when her legs didn’t respond to their call any more.”
“Before going in her last trip, she asked me to came here, where she saw the beginning of the horizon. She asked me to throw this necklace into the sea.”
In her hands, she was holding a leather string, with a perfect shell.
“I think this was her way to came home.”
“Yes”, he said, “I think you should throw it from the top of the lighthouse; ifyou want to, I will take you there.”
She smilled and she got up.
“Came on!”
Then he understood why the lighthouse keeper would say the calling of the sea had taken away his mermaid. But, to him, the calling of the lighthouse, had won. Love had not been enough to loosen one’s ties and to bind the other.
But he was looking for a mermaid for years. Now that he had found her, if the sea calls her… he will learn how to swim!

...The end? ...

terça-feira, 23 de outubro de 2012

Quimeras (ou histórias de um faroleiro) / Chimeras (Or stories of a lighthouse keeper) -- II



E foi numa tarde de fim de Verão, quando os dias ainda são quentes, mas a lua chega mais cedo; foi numa tarde de Verão que a viu.
Estava sentada na praia, a olhar o mar, o cabelo não era nem longo nem azul, como o da sereia que lhe povoava a imaginação. Mas, ainda assim, sabia que era ela.
Lembrou-se do velho faroleiro, e pediu-lhe emprestada um pouco da sua coragem. E assim se aproximou dela e disse-lhe olhos nos olhos – sei que és uma sereia, os teus cabelos não são azuis, mas ondeiam como o mar.
E ela sorriu.
“Eu não sou sereia, mas tenho em mim as memórias de uma que percorreu este mar.”
“Conta-me”, pediu ele.
A minha avó. Foi sereia, em tempos. Quando era da minha idade. Ao entrar na água, o cabelo ficava azul. Toda a gente achava estranho, todos a evitavam, não entendiam metamorfoses. Por isso costumava nadar sozinha, flutuava nas ondas, enquanto imaginava os mundos que se achariam para lá do horizonte. Todos lhe diziam que para lá do horizonte não havia nada, mas ela ouvia o chamamento do mar.
Houve um faroleiro que acreditou nela, porque sabia que os navios que orientava vinham do horizonte. Era ele que a chamava de sereia, dizia que era por isso que o seu cabelo se fundia com  o mar.”

Pegadas, by Isa Lisboa

And it was on an afternoon in late summer, when the days are still warm but the moon comes early. It was on a summer afternoon that he saw her.
She was sitting on the beach looking at the sea, her hair was neither long nor blue, like the mermaid who lived in his imagination. But still, he knew it was her.
He remembered the old lighthouse keeper, and borrowed a bit of his courage. And so he approached her and told her in the eye - I know you're a mermaid, your hair is not blue, but it has waves like the ones in the sea.
And she smiled.
"I'm not a mermaid, but I have in me the memories of one that swam in this sea."
"Tell me," he asked.
My grandmother. She was a mermaid, once. When she was my age. When entering the water, her hair turned blue. Everyone felt weird, all avoided her, didn’t understand metamorphoses. So she used to swim alone, floating on the waves, while imagining what worlds could be found beyond the horizon. Everyone told her that there was nothing on the horizon, but she heard the calling of the sea.
There was a lighthouse keeper who believed her, because he knew that the ships he guided came from the horizon. It was he who said she was a mermaid, he would say that was why her hair blended with the sea. "


sábado, 20 de outubro de 2012

Quimeras (ou histórias de um faroleiro) / Chimeras (Or stories of a lighthouse keeper) -- # 1


Todos os dias ia à praia. Havia dias que percorria o areal de um extremo ao outro, seguindo o trilho molhado que a maré deixava. Outros dias subia à escarpa mais alta, aquela de onde se avistava toda a praia, todo o mar em frente.
À água não se aventurava, não sabia nadar.
Todos os dias ia visitar o mar.
Todos julgavam que cismava por não saber nadar, que por isso olhava a água, que os seus olhos eram de aventureiro com medo.
Mas ele saía todos os dias porque ouvia um canto que já ninguém ouvia. O canto da sereia… Saía todos os dias à procura dela, sabia que um dia a havia de encontrar ali, a dançar com as ondas do mar, ou a caminhar nas areias da praia, fundida com os humanos.
Foi já há muitos anos que ouviu a história. Foi o velho faroleiro que lha contou. Um dia estava a vigiar as águas em frente, e ouviu um canto de mulher, a voz mais linda que já havia ouvido. Das águas surgiu um rosto inimaginável, com olhos que até ao longe lhe penetravam na alma. Cabelos que dir-se-iam a extensão do mar, azuis, ondeantes.
Ainda antes de ela mergulhar, já o velho faroleiro sabia que era uma sereia, daquelas sobre quem avisavam aos marinheiros.
Todos chamavam o velho faroleiro de louco, mas ele sempre viu muita sabedoria nos seus olhos, por isso não tinha razões para considerar menos nas suas palavras.
E, assim, todos os dias ia até à praia. Um dia havia de encontrar ali a sua sereia.


(Setembro 2012)


Sagres, by Isa Lisboa
Everyday we went to the beach. Some days he was on the beach from one end to the other, following the trail left by the tide. Other days he would climb to the highest cliff, the one where he could see the whole beach, the all sea in front.
He didn’t venture himself to the water, he didn’t know how to swim.
Every day he would visit the sea.
Everyone thought he brooded for not knowing how to swim, that was why he watched the water, that his eyes were the ones of a scared adventurer.
But he went out every day because I heard a song that no one listened to any more. The siren song ... He went out every day looking for her, he knew that one day he would find  her there, dancing with the waves, or walking in the sand, fused with humans.
It was many years ago that he had heard the story. It was the old lighthouse keeper who told it to him. One day he was watching the waters in front, and he heard a woman singing, she had the most beautiful voice he had ever heard. From the waters appeared an unimaginable face, with eyes that even by far penetrated the soul. With hair that seemed the extent of the sea, blue, undulating.
Even before she dived, the old lighthouse keeper already knew it was a mermaid, those about who the sailors were warned about.
Everyone would call old lighthouse keeper crazy, but he always saw a lot of wisdom in his eyes, so he had no reason to believe less in his words.
And so every day he was going to the beach. One day he would find his mermaid.


(Setember 2012)



sábado, 13 de outubro de 2012

Verbos / Verbs

Foto: Heart of stone _ vancity197
Trazia o verbo amar no bolso. Quando lhe parecia, tirava-o do bolso e dava-o com um sorriso, aquele que se adequava.


Nunca se gastava, tinha uma caixinha cheia de amo-tes, junto com outros verbos que se colavam bem.

Só se esqueceu de que o Amor é um substantivo e de que precisa de um pronome.

-.-.-.-

We would carry the verb love in it’s pocket. When it seemed right, would take it from it’s pocket and would give it with a smile, the one that fitted.

It would never finish, he had a box full of I love you’s, along with other verbs that glued well tighter.

He only forgot that Love is a noun e that it needs a pronoun.

sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Poderia vir Morfeu / Morpheus could come

O vento passa por entre as folhas das árvores, tocando-me uma sinfonia ritmada, certa.

Aqui sentada, poderia vir Morfeu, entregar-me-ia toda a ele. Deixaria que o seu beijo me fizesse descansar, envolta pelo cheiro da terra, pela vida que dela pulsa.

Talvez que a terra me puxasse para si, e me tornasse eu também árvore, de raízes firmes e enterradas no chão, que os meus braços se transformassem em galhos. Com folhas como estas, para que o vento fizesse música comigo.

Que o meu corpo se fizesse tronco, que daqui a muitos anos alguém tentasse rodear-me com os braços e não achasse a mão do outro lado.

Árvore robusta. Resistente ao tempo.

Aqui estou deitada. Talvez apenas as árvores peçam às suas raízes que saiam e me envolvam os tornozelos, os pulsos, as pernas, toda eu.

E assim não sairei daqui.

E assim terei um lugar.

Sonhei-me feita árvore, by Isa Lisboa


The wind passes between the tree leaves, playing a rhythmic symphony.

Seating here, Morpheus could come, I would give my self to him. I would let his kiss to make me rest, involved with the earth’s smell, with the life bursting from it.

Maybe the earth would pull me to itself, and I would become a tree also, with firm roots, roots buried in the ground, and my arms would became branches. With leaves like these ones, so that the wind would play music with me.

May my body become a tree trunk, that many years from now someone would try to surround me with their arms and would not find the hand on the other side.

Sturdy tree. Resistant to time.

Here I am lying down. Maybe the trees just ask their roots to come out e wrap my ankles, my wrists, my legs, all me.

And so I will not leave.

And so I will have a place.


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