Quem lê / Who's reading

"a escrita é a minha primeira morada de silêncio" |Al Berto

sexta-feira, 30 de março de 2012

Mergulho / Diving

Mergulho no mar, aturdida pela imensidão, seduzida pela força das ondas.
A primeira sensação que me assalta é a de frio, a água parece gelada, faz a minha pele estremecer.
Mas fico, procuro a liberdade de deslizar pela água, de me misturar nela, de me perder no horizonte…
Já não sinto frio, também não sinto calor, não me sinto mulher, nem criatura marinha, esqueci-me de tudo.
Volto a ter consciência de mim. Talvez tenha percorrido quilómetros, não sei. Regresso à superfície, em busca de respirar. E encontro-te. Posso agora mergulhar nos teus olhos. Flutuo nos teus braços, consigo ouvir a melodia das ondas onde me afoguei. As ondas que me trouxeram aqui.


09.Março.2012, algures no mar, contigo


Rafal Milach from the series '7 Rooms'
I dive in the sea, astounded by the huge ocean, seduced by the strength of the waves.
The first feeling that comes is cold, the water seems icy, makes my skin shake.
But I stay, looking for the freedom of slidding trought the water, get mixed with it, loosing myself in the horizon…
I don’t feel cold anymore, don’t feel heath either, I don’t feel like a woman, nor as sea creature, I forgot everything.
I regain conscience of myself. Maybe I have wandered for miles, I don’t know.
I return to the surface, looking for breathing. And I find you. Now I can dive in your eyes. Floating in your arms, I can ear the song of the waves I’ve drown myself into. The waves which brought me here.


09.March.2012, somewhere in the sea, with you

sábado, 24 de março de 2012

Ave (Nocturna) / Bird (of the Night)

Mulher-pássaro, Otto Stupakoff

O teu amor era uma criatura da noite.
Iludiu-me porque pediu para entrar, sem eu perceber que era esse o truque. Afastava-me dos espelhos, não sei se para que não o olhasse no reflexo, o que põe a nu a natureza da alma. Ou para que não visse as minhas faces brancas, pouco a pouco privadas de sangue.

Esqueceste-te da minha natureza de ave selvagem, não me basta voar, preciso lançar-me ao vazio, e depois subir o mais que conseguir.
Era inevitável perceber as grades, por mais que te esforçasses por as fazer parecer transparentes.

Sem mim não consegues voar, atiraste-me. Não pude evitar sorrir. Vi que me tornara num dos espelhos que tanto temias.
Ainda assim, não desististe. Os predadores não desistem. Ias continuar por perto. Por isso precisava de esquecer, esquecer o teu toque no meu pescoço…

Disparei uma bala de prata contra o meu peito. Deve ser suficiente. Se não for, cravo uma estaca no meu coração teimoso! Ficará um pouco mais desfeito, mas sobreviverá. Renascerá. Para as criaturas do dia. Para voar.

~~ *** ~~

Your love was a creature of the night.
He deceived me by asking permission to come in, I didn’t understand that was the trick. He would keep me away from mirrors, maybe so that I wouldn’t look at the reflexion, the one that exposes the nature of the soul. Or so so that I could not see my white face, bit by bit deprived of blood.

You forgot my wild bird nature, it is not enough for me to fly, I need to launch my self on the emptiness, and then go up as much as I can.
It was inevitable to understand the grids, no matter your effort to make them seem transparent.

Without me you can’t fly, you shot at me. I couldn’t held smiling. I saw that I’d becomed one the mirrors you feared so much.
Still, you didn’t give up. Predators never give up. You would stay around. So, I needed to forget, forget about your touch in my neck…

I shot a silver bullet against my chest. That should be enough. If it isn’t I’ll nail a stake to my stubborn heart! It will be a bit more shattered, but he will survive. Reborn. To the creatures of the day. To fly.

sábado, 17 de março de 2012

Crisálida / Chrysalis

Como todas as borboletas, começara por ser crisálida, frágil, envolta no seu casulo protector, talvez desinteressante, achariam alguns.
Mas descobriu que, se quisesse, podia transformar-se em borboleta.
E, apesar das dúvidas que a assaltavam, deixou que as asas crescessem, deixou que a côr  as invadisse, e rasgou a película que lhe tinha servido de casa por tanto tempo.
Gostou da sensação nova, de voar, de cortar o vento, de escolher os caules onde pousar, de procurar pólen, de se deixar estar nas flores do prado, desfrutando de um pouco de sol.
Imagem da Web
Mas, ao contrário de todas as outras borboletas, um dia voltou à pequena planta onde pela primeira vez voou.
Enrolou-se nas suas próprias asas, indiferente a como estavam mais coloridas, e tapou-se com o que restava do velho casulo.
Não sabe bem quanto tempo lá ficou. Talvez tenha sido apenas alguns dias. Ficou até que uma outra borboleta ali passou. Ficou talvez com curiosidade sobre aquela estranha crisálida, creio que a reconheceu, bateu à porta, não obteve resposta, está um dia lindo, disse, anda, sai, ainda há tanto para voar.
Sem movimento de resposta, seguiu.
A borboleta-crisálida espreitou para fora, viu o sol, o dia, o céu. Sim, queria sair, voar. Já descansara. 



Curiosidades:
# A borboleta é considerada um símbolo de ligeireza e de inconstância, de transformação e de um novo começo.
# No Japão, a borboleta é um emblema da mulher, por ser graciosa e ligeira. 
# Na mitologia grega, a personificação da alma é representada por uma mulher com asas de borboleta. 


Like all butterflies, she was born a chrysalis, frail, wrapped in her protective cocoon, maybe uninteresting, some would say.
But she discovered that, if she wanted to, she could turn into a butterfly.
And, despite the doubts that assailed her, she allowed her wings to grow, that colour would invade them, and she ripped the cloth that was her home for so long.
She enjoyed that new feeling, of flying, cutting through the wind, choosing the leaves in which to land, searching for pollen, letting her self be in the meadow flowers, enjoying some sun.
But, unlike all other butterflies, one day she returned to the small plant were she flew for the first time.
She wrapped in her own wings, unconcerned about the fact that they had more colour now, and covered her self with was left from the old cocoon.
She’s not sure how long she stayed there. Maybe just for a few days.  She was there until another butterfly went by. Maybe was curious about that strange chrysalis,  I believe there was also recognition, knocked on the door, no answer, it’s a beautiful day,  come on, come out, there’s still so much to fly.
With movement as a response, went away.
The butterfly-chrysalis peeked outside, saw the sun, the day, the sky. Yes, she wanted to go out, to fly. She had rested.


Curiosityes

# The butterfly is a symbol od slight and inconstancy, of transformations and new beginings.
# In Japan, the butterfly is a symbol of the woman, because she is gracefull and slight.
# In greek mihtology, the personification of the soul is represented by a woman with butterfly wings.

quarta-feira, 14 de março de 2012

Conversas com o mar / Talkink with the sea


Olá, velho amigo. Hoje vim ver-te. Ouvi-te chamar-me e cá estou. Vestiste-te com aquela mistura de azul que não consigo descrever. Não consigo nunca pôr em palavras nenhuma das tuas roupas…
Estás agitado hoje! Talvez só me chames quando estamos contrários…
Os dias estão já mais longos, posso ficar aqui um pouco mais, sentada contigo.
Com os pés enterrados na areia, deixando que o vento me desalinhe o cabelo.
Oiço-te. Até a tua fúria é bela. As ondas que desenhas, a forma como se aproximam vorazmente da costa, a força com que enfrentam as rochas, num combate de paciência contra ansiedade. Ou como descansam na praia apagando os passos de quem acabou de passar. Hoje queres o areal para ti.
Mesmo assim aproximo-me, beijas-me os pés, sinto os salpicos de sal no rosto.
Fecho os olhos, assim ouço-te melhor. Escuto a sinfonia que me compuseste, és imenso!
Já vejo a minha sombra reflectida na areia. É hora de te deixar.
Volto.
Quando me chamares.



Hello, old friend. I came to see you today. I heard you call for me and here I am. You’re dressed with that mix of blue I can’t describe. I can never put in words any of your clothes…
You are restless today! Maybe you call me only when we are opposite…
The days are longer, I can stay a bit more, seated with you.
With my  feet buried in the sand, allowing the wind to tangle my hair.
I can hear you. Even your fury is beautifull. The waves you draw, the way they came to the shore, fiercely, the streght they have facing the rocks, in a fight of patience against anxiety. Or how they rest on the beach, erasing the footprints of those who just went by. Today you want the sand for yourself.
Still, I come close, you kiss my feet, I feel the bits of salt in my face.
My eyes are closed, I can hear you better, that way. I’m listening to the symphony you wrote me, you are vast.
I can see my shadow reflected in the sand. It is time to leave you.
I will came back.
When you call me.

quinta-feira, 8 de março de 2012

Pequena bailarina / Little balerina

Atava as pequenas sandálias delicadas. Preparava-se para um ensaio, para se perder na música, nos movimentos sincronizados, na beleza das cores suaves, dos tecidos esvoaçantes... 
Em frente ao espelho, pronta para sair para mais um dia, parecia, por momentos, ver esse reflexo esbatido, por entre as luzes que entravam pela janela.

~**~

She would ty the delicate shoe. Getting ready for a rehearsal, to get lost in the music. in the syncronized movements, in the beauty of the soft colours , of the flowing fabrics...
Facing the mirror, ready to go out for another day, for a moment, that dimmed  reflextion seemed to appear, between the lights coming through the window.


Por vezes, a caminho do emprego,  a memória acompanhava-a,  o corrimão onde se apoiava parecia-lhe uma barra, a carruagem  a passar, aplausos. Lembrava-se das histórias que contava, das que gostaria de ter contado, deslizando pelo palco.  Agora já não contava histórias, mas ainda as imaginava.

~**~

Sometimes, on her way to work, those memories followed, the banisters were she grabed on, felt like a bar, the train going through, like applause. She would remember the stories she used to tell, the ones she would like to have told, slidding through the stage.  Now she didn't tell stories anymore, but she still imagined them.

           


Quando podia, fugia. Para lugares só seus. Nesses dias, era assim que se via. Como a pequena bailarina que já foi. Podia vestir-se de cisne e voar, ou de árvore e esticar os ramos até ao infinito; ser Giselle, Cinderela, Julieta, Sininho. 
Podia ser quem a música que tinha dentro de si lhe pedisse. 
Estivesse junto ao mar, dançava com as ondas; estivesse num bosque, voava com os pássaros; estivesse num campo aberto, seria flor, frágil, movendo-se ao vento. 

~**~

When she could, she would run away. In those days, that's how she saw herself. Like the little balerina she once was.   She could dress like a swan and fly, or like a tree and spread her branches into infinite; be Giselle, Cinderela, Juliet, Tinkerbell.
She could be who ever the music inside hersel would ask her.
By the sea, she would dance with the waves,;in the woods, she would fly with the birds; in an open field, she would be a flower, frail, moving with the wind.


                               

Da janela da sua casa, conseguia ainda ver as ruas da sua terra natal... As ruas que percorreu pela mão da sua mãe, até à pequena loja de vestidos, para comprar a roupa para a sua primeira aula. A mesma loja onde anos mais tarde comprou o vestido que ainda guardava no seu quarto. Um tecido macio, cores suaves, pequenas plumas, discretas, um pequeno motivo desenhado com pérolas. Guardava também os ganchos com que prendeu o cabelo, para o libertar no final. 

~**~

From the window of her house, she could still see the streets of her home town... The streets she went by, holding her mother's hand, to the small dress store, to buy clothes to her first class. The same store where years later she bought that dress, the one still kept in her bedroom.  A soft cloth, smooth colours, small feathers, discrete, a small print drawn with pearls. She also kept the hairpins, she used to hold her hair, to set it free at the end.





Um dia ... deixou a sua janela e saiu para a rua e dançou, dançou, libertou toda a sua alma...! Dançou até ficar exausta. E viu que as pessoas já não avançavam apressadas, sem a ver. Um círculo juntou-se à sua volta. E ouviu aplausos. Voltara ao palco.  

~**~ 

One day ...  she left her window and she went out and she danced, and danced, letting her soul free...! She danced until she was exhausted. And she saw that people were no longer moving on a hurry, without seeing her. A circle gathered aroud.  And she heard aplause. She was back on the stage.



Fotos da série / Photos from the series:  
New York City Ballerina Project - Dane Shitagi


A propósito do Dia Internacional da Mulher, aqui fica um poema para todas nós, à distancia de um click:

quinta-feira, 1 de março de 2012

Libertar-se / Getting free

Amarras, Imagem da Web
Tiraram-me as medidas compraram tecidos cortaram-nos em peças e coseram-os a linhas de cores de fantasia.

Tentaram tirar-me os panos - são trapos - com que protejo do frio a nudez que é só minha.

Mostraram-me anéis e pulseiras os meus pulsos queriam ser livres e os anéis sufocavam a veia do coração.

Riram por preferir os meus andrajos - és feia assim e podias ser bonita se - por não ter medo que o Tempo me alcance porque temos que o parar ou fugir antes. Por ter a triste ilusão de ser Feliz, porque a Felicidade é preencher o formulário de entrada, e ser aceite e sorrir, sorrir até que doa.

E segurar o copo que te dão e beber quando brindam a ti, mesmo que já te tenhas esquecido de a quem bebes, porque não brindam a ti, mas a nós, porque tu já não existes, nem nunca exististe.

Retirado do baú, escrito em 18.01.2006

They took my measures bought fabrics cuted them into pieces and stitched them with  fancy colors.

They tried to take my cloths - they're rags - the ones which protect my nudity from the cold, the nudity that is mine alone.

They showed me rings and bracelets my wrists wanted to be free and the rings stangled the heart.

They laughed beacause I choose my rags - you're ugly and you could be beautifull if - for not to being afraid that Time catches up because we have to stop it or run away before. Because I have the sad illusion of being Happy, because Happiness means filling out the entry form and be accepted and smile, smile until it hurts.

And hold the glass they give you and drink when they make a toast to you, even if you've forgotten who you're drinking to, because it's not a toast to you, but to us, you no longer exist, nor ever existed.


Written in 18.01.2006
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